sábado, 19 de dezembro de 2009

Eu sei que dói em você, assim como dói em mim. É difícil encontrar um alivio que nos seja imediato. Não seja tão pessimista, a vida caminha como tem de caminhar. O que ficou pra trás, se perdeu no caminho, se esqueceu, lembrou, sonhou – tudo. Mesmo não sendo a melhor pessoa para tratar dessas coisas do coração, seja por falta de escrúpulos ou de experiência, te digo que não vale a pena parar de tentar e acomodar; ler o jornal de domingo na terça, tomar um café frio e achar que poderia estar pior. A vida, amigo, é uma só. Seria mais fácil se você parasse de buscar desculpas e fazer perguntas que nunca irá aceitar a resposta – ou que nunca terá. A vida é pra ser vivida, revirada. Procure ela nos vãos, não deixe que ela escape e se depare com um beco qualquer. Por mais escuro que o caminho seja, por mais sombra e solidão, tentar é a única coisa que faz sentido nesse caos que a gente caiu, gradativamente. Até eu, desesperançada densamente, e terrivelmente feliz, nas minhas oscilações, consigo enxergar um farol perdido por aí, esperando a gente atracar.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Na ansia de trilhos,
o trem passa sem qualquer sutileza.


O homem não se importa com
o choro nem com as mãos;
viajar é preciso.

A saudade é permanência em cada canto da minha
alma.
Eu também ja fui à muitos lugares que não conheço e
ainda
há espaço para mais.


A fome do meu corpo pede.
A fome do meu futuro imediato exige.
A fome do meu presente não se importa.


Porque o homem também é como um trem(porém,de uma sutileza de fada).


A fome do meu passado se chama constância.


E o trem,por entre montanhas e pedras e vidas,
chora seu apito.


(chora,porque a vida é curta para despedidas)
Não quero cantar a sorte ao vento
e receber os estragos das más previsões.
Não quero tocar no que não seja (e)terno
nem vislumbrar no êfemero a possibilidade
do que não existe.


Eu quero o concreto da certeza.
Enfim,


morrer fatigada no tédio que é
saber.
Quando meu filho nasceu
pedi a Santa Bárbara por tempos sem tempestade,
a Santo Antonio pelo casamento,
a Santa Edwiges pelas finanças.
Só me esqueci do destino da cada um,
sem rumo,
sem jeito.


Fatal.
Digo sem gosto e com as mãos ásperas,que dói.Dói feito morte,já que é perda em vida - viva.Sinto descer da boca até o interior do meu corpo uma queimação involuntária,que me desestrutura,me anula.
Bem sei que de nada adianta minhas preces,a minha vontade de mudança,porque o mundo é impassível aos meus pedidos,surdo e oco.A minha falta de palavras,a minha má expressão da língua,essa que me deu nome,sonhos e uma pátria.Ah,Deus,como queria me transpor,me 'desavessar' desse avesso contínuo que é minha vida.
A noite vem como tormento,é quando me sinto pulsar.Vai abrindo todas as portas,gritando.Não deixa adormecer as feridas.Quer sangue pungente,fluindo.
Pergunto-me:para que tanta complexidade?O aconchego e a claridade me bastavam.E agora - agora? - o cheiro soturno dos cravos deixa ébrio até a lucidez das únicas certezas.
Clareia,clareira é que preciso.Perder-me na vastidão do VAZIO.Confundir-me,enfim,esquecer.Possível será até onde durar - me durar.Porque,a cada dia,brigo com o infinito de tudo que me dura.Só não sei o final:existe algum vencedor?
Para devorar o mundo
Dispenso pratos e talheres.
As mãos me bastam:


Porque não há receioou pudor
quando se come a própria
Alma.
Ah,Deus.Tire o resto de mim ou me devolva tudo.
sofro de amor masoquista:a vida pulsa com dor e mesmo assim eu amo.e não há infortúnio que me faça desistir,que me faça parar com essa música que corrói e torna completo.
sou vaga.sou vazia.sou,viciosamente,uma mentira.mas,meu coração,que é isento de seus próprios crimes,é o que de maior existe no mundo.e transborda.
quero sua palavra mansa
cantando na hora
do jantar.

quero feijão no prato,
você do meu lado

nada mais há de me faltar.
eu te digo,rapaz:
a vida é pandoralice.
desde quando nasce
caixa abre e
o não-sei-o-que
invade e bagunça e
toma conta do destino
da gente.
eu sou de luna. a noite, as minhas fases ditam o movimento do mar.
caí numa só vertigem:desacreditei da poesia e me refiz
em prosa.
toda concreta e cheia de pudores.


continuo tonta:
paredes de tijolos me zangam a visão.
ela pediu que seu chico de assis
assitisse por seu bichinho:


tinha um pássaro de uma asa só.


ao anoitecer,chorava manso uma oraçãoque não lhe pertencia.


- são francisco, dê uma asa pra quemquer voar.


aos outros, basta ter pés no chão
nessa sua vida torta, sou reta feito poste.
só enxergo as coisas que estão debaixo do meu nariz:
uma pedra,uma moeda,uma foto três por quatro.


tudo o que não te faz mais falta.

do dia que eu descobri.

Não era fácil viver naquelas circunstâncias avassaladoras. Pouco acreditava que o dia viria com sol e tudo seria claridade e aconchego. Nesses tempos de perda de tempo e pouco amor-próprio, eu sofria de medo – medo de ser noite e prateado para sempre.
De certa forma, eu me obrigava a gostar de você assim como um dia me obrigaram a fazer parte e a amar o mundo, com um gosto azedo na boca e um aperto esmagador no peito. Não quis intervir, já era difícil demais pensar em uma solução, quanto mais colocá-la em prática. Só sei que, por fim, o tédio me consumia da cabeça aos pés e eu não tinha mais condições de viver daquela forma. Era preciso mudar e, como se o milagre ou o azar realmente existissem e tomassem corpo, te conheci.
Confesso que foi difícil acreditar. Depois de buscas perdidas e fingimentos de que procurar não fazia parte da atual versão do que eu sou, ou melhor, do que eu era, você surgiu depois de ter surgido. Digo, dentro de mim, como um canal que pisca na televisão ao apertarmos o controle remoto. De primeiro, foi só no físico, necessidade casual. Sei que essa é uma comparação infantil, boba, entenda como quiser. Mas o fato é que eu te conheci depois de ter conhecido, e isso me mudou.
O meu tédio se consolidava em sono. Já nem tinha forças para me debruçar na janela e ver o dia morrer, lentamente. Eu morria a cada dia, e nem mais sabia que era isso mesmo. Primeiramente perdia-se a vontade, depois a cor, depois o sonho. Que criatura não gostaria de dormir tranqüila, sonhando bosques, e acordar afoita de vida? Eu não.
Me forçando a te amar aprendi, involuntariamente, a te odiar. E te odiando é que descobri que te amava por inteiro – e que para isso já não existia mais cura. Ou melhor, que nunca existiu.
O meu dia de libélula começava a alvorecer no laranja daquelas prateleiras tortas. Tortas como toda a minha vida humana fora. Renascer toda asas me deixou fascinada. Era como não ter limites, poder me transpor, transpirar, translucidar; encontrar um caminho, aquele caminho que eu, antes perdida em pernas, procurava.
Eu zumbizava, toda aparvalhada. Mas só assim era feliz.
Libélula entre luas e cais – um farol perdido em maio.