O árido. O seco. O soco.
O sol me travestindo de fúria. Lá no Cafundó dos Confins de mim, a paisagem
gemia ao menor sopro.
João procurava (sem
êxito) uma sombra de árvore, um vestígio de vento, um respingo de água para
desangustiar o corpo. Encontrava-se na liminaridade do ver e imaginar. Pobre coitado.
Não percebia: um passo adiante e penetraria na febre do ser-tão.
É claro que me comovia
seus planos e a sua trajetória até ali. Mas, o que eu poderia fazer? Marte me
dominava e amordaçava. Meus olhos secavam qualquer sinal de vida, inclusive a
de João. Cada um carrega seu próprio desalento e o de João acabaria ali. Quem
sabe o que lhe reservaria as outras estações?!
João recostou-se em um
dos moirões da cerca. Ficava intrigado com a durabilidade daquela madeira em um
local onde tudo o que ficava parado ruía. Lembrou-se de uma antiga companheira,
Joana, e em tudo o que poderia ter brotado: alguns filhos, talvez uma casa de
alvenaria no Rio, assim como a do primo Luiz.
O sonho, assim como
Joana, escaparam com a seca e seu desdobramento sobre as antigas pastagens. Desvencilhou
o pensamento do desamor para debruçar os olhos na estrada de chão. Avistou um
caminhante em frangalhos e olhou para si: estavam em irmandade. Seus olhos
poderiam ter marejado, mas estava quente demais para isso.
O homem caminhava com
dificuldade e, aos poucos, foi se tornando nítido e grande. Um grande maltrapilho.
Carregava uma pequena
bolsa verde encardida, de trabalhador rural. João e o caminhante se
entreolharam e nada disseram. As bocas opacas produziam um som seco. Minutos depois,
o homem revelou sua identidade. Chamava-se Jesuino.
Abriu a bolsa.
Seus dedos estavam
sujos de terra. E tremiam. Retirou um resolver e, antes que João pudesse clamar
misericórdia, Jesuino atirou no desconhecido irmão. Na cabeça – para preservar
o coração.
- A passagem para o
paraíso – sussurrou.
E outro estampido ecoou
pelo árido verão.