domingo, 27 de outubro de 2013

A poética na/da rua ou Os escritos das passagens.

Na influência do meu antigo
sempre quando é nunca
porque o passado não traz.

Estava inscrito num banco de uma das passagens. Lamentou não ter caneta para anotar. Assim, na falta, utilizou-se de seu sistema memorialístico capenga mediante todas as extensões: caneta, papel, gravador. Quem haveria escrito, questionou. E, mais: por quê? Lembrou-se da Regina cantando Belchior em um dos passeios de bicicleta. Era inevitável: os antigos sabiam das coisas. Seja roupa que não sirva, seja o que não se traz. O passado evoca, cá dentro. E se ressentir é re-sentir e, portanto, sentir de novo, nada se iguala à possibilidade (inexistente) de se ter efetivamente, de agir sobre mais uma vez. E, se tivesse, assim o seria? Melhor - faria?

Caminhou por outras passagens buscando registrar qualquer mínima inscrição. Intitularia: a poética na rua. Talvez das ruas, ou o escrito das passagens. Deixou para se ater no supérfluo depois (qualquer coisa seria segundo plano ou quase-sem-importância tendo como corpo as transgressões do tempo na vida, ou da vida transgredida no tempo)

Parou para descansar em um café com bandeiras de inúmeros países. Com lamento - mas um fundo de felicidade clandestina - pensou que nem todos, os vários de vários [países], poderiam traduzir as inscrições e, caso pudessem, talvez não o fariam de modo a compreender sua complexidade. Pediu o de costume e observou a vidraça, esperando o mais um dos tantos que encontrava e se envolvia e enjoava.

sábado, 5 de outubro de 2013

Ser é clandestino

Ser é clandestino, pensou. Depois chegou a conclusão que essa frase não poderia ser sua, devo ter ouvido em algum lugar. Tirou a água da chaleira e continuou seu ritual cotidiano. Mas a afirmativa, fosse sua ou de algum autor desconhecido, famoso que fosse, permanecia como um incessante martelar.

sábado, 31 de agosto de 2013

A caixa dos esquecimentos

Agosto

            Agosto sempre fora o mês do desassossego. Ele atravessava a vida das pessoas com um descomedido peso, embora aparentasse leve brisa. Era possível sentir que, no fundo, todos ansiavam as boas novas floridas de setembro. Em Sempre-viva, o cheiro de terra era forte e o pó da estrada se levantava facilmente com o trânsito dos carros. Era domingo, o dia anunciava e ardia, nos pequenos detalhes, que algo grande iria acontecer. Valentina passeava pela cidade ansiosa pelo encontro que teria com Vitório. Ele demorava a chegar mas ela - na tentativa de consolo e fomento de esperança - falava repetidamente que era o ônibus, só podia ser; ele deve ter quebrado na estrada, essas coisas acontecem. Durante a tarde, o sol, que até então ardia de terra, foi se desvanecendo e dando lugar às nuvens carregas de um azul acinzentado, que tomava conta do amplo céu. A distância de Ypês à cidade de Sempre-viva era apenas de 47 minutos – Valentina havia contado certa vez que foi encontrar Vitório na rodoviária. Já haviam se passado três horas desde o momento que Vitório deveria ter saído de Ypês. As nuvens carregadas de azul continuavam a ocupar o céu. O vento invadiu a cidade, balançando fortemente todas as árvores da grande avenida. Valentina olhava todo esse espetáculo da natureza com medo e excitação – era essa a sua reação em meio a tempestades e à ruas desertas e escuras. As folhas caíam das árvores, girando em uma violenta espiral até que pequenas pedras de gelo começaram a cair. Elas partiam-se em dois, três pequenos pedaços ao irem de encontro ao chão de paralelepípedos. Valentina se escondeu em uma pequena garagem que estava aberta. Ela era pintada de um laranja desbotado, com alguns sinais de infiltração em um dos cantos superiores. Havia, também, algumas teias de aranha tecidas com o maior dos zelos. As pedras começaram a cair mais e mais, e faziam grande estardalhaço naquela tarde vazia de agosto. De repente, toda excitação foi convertida em medo, apenas. Um medo que parecia preencher aquela garagem laranja, e até mesmo aquela enorme avenida. Ele não viria, ela pressentia. Não viria. Valentina havia sonhado com essa possibilidade três noites seguidas. No primeiro sonho, eles estavam em uma sala completamente branca, que possuía como móveis apenas um sofá de três lugares, igualmente branco. Valentina falava com Vitório, entretanto, ele parecia não escutar. Ela, na tentativa de verter a atenção dele para o que ela dizia, foi com suas mãos lívidas e frias até o rosto dele, de maneira que cada palma da mão atingisse as faces do homem que estava imóvel a sua frente. Todavia, ela foi surpreendida com a impossibilidade de concretizar sua ação: era como se Vitório estivesse envolto por uma caixa de vidro. Acordou para a realidade com seus próprios gritos produzidos no outro mundo. O segundo sonho foi um tanto cruel, também. Valentina subia as escadas que davam no apartamento de Vitório. Ela estava eufórica para contar a ele as novidades do seu dia: havia ganhado duas passagens para o sul do país, e queria levá-lo como acompanhante. Já havia planejado mentalmente toda a viagem, traçado inúmeros roteiros que agradassem a ambos. Quando chegou à porta, percebeu que ela estava apenas encostada. Ao entrar no apartamento viu que ele estava completamente vazio. Havia apenas, no chão da sala, um bilhete que dizia assim fui embora por não te amar. No terceiro sonho, ela estava em seu quarto vendo um álbum de fotografias. Ele era de um verde musgo, com as pontas desgastadas, mostrando o bege do material que o compunha. Valentina notou que o álbum, até então completo, estava com alguns espaços vazios. Procurou uma foto dos dois, para colocar no porta-retrato que havia comprado, mas já não havia foto alguma. Sentada em um canto da garagem, recordou-se dos sonhos e começou a chorar.

quinta-feira, 13 de junho de 2013

O mais do mesmo: apreensão sobre as manifestações contra as tarifas de ônibus.

A minha cabeça está fervilhando de pensamentos, o corpo afetado. São tantas as imagens e as palavras sobre as manifestações contra o aumento das tarifas de ônibus. E que ao mesmo tempo não é apenas contra o aumento da tarifa: é algo bem maior. É uma expressão da insatisfação como um todo: transporte público, educação, saúde, lazer sucateados e caros (caso você queira um serviço de qualidade - que muitas vezes é até questionável. digo, a qualidade dos serviços caros). Pouco entendo de política, economia, história (sim, história). Como diz Adélia Prado: "Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina". E aqui estou.

Essa semana li em um blog/jornal chamado A Folha do Gragoatá uma postagem com a diva absoluta Laura de Mello e Souza respondendo ao questionamento: Por que estudar História? (aliás, foi divulgado nas redes sociais essa semana que esse curso está entre os menos promissores. jura?). Vou colocar aqui alguns trechos nos quais a historiadora tenta responder ou, ao menos, refletir sobre.

"Mas a História é, tenho certeza disso, uma forma de conhecimento essencial para o entendimento de tudo quanto diz respeito ao que somos, aos homens. Os humanistas do renascimento diziam que tudo o que era humano lhes interessava. A História é a essência de um conhecimento secularizado, toda reflexão sobre o destino humano passa, de uma forma ou de outra, pela História. (...)

A História é fundamental para o pleno exercício da cidadania. Se conhecermos nosso passado, remoto e recente, teremos melhores condições de refletir sobre nosso destino coletivo e de tomar decisões. Quando dizemos que tal povo não tem memória – dizemos isso frequentemente de nós mesmos, brasileiros – estamos, a meu ver, querendo dizer que não nos lembramos da nossa história, do que aconteceu, por que aconteceu, e daí escolhermos nossos representantes de modo um tanto irrefletido (...)

Não acho que se toda a humanidade fosse alimentada desde o berço com doses maciças de conhecimento histórico o mundo poderia estar muito melhor do que está. Mas a falta do conhecimento histórico é, a meu ver, uma limitação grave e, no limite, desumanizadora. (...)

Portanto, volto ao início, à diversão, e acrescento: o conhecimento histórico humaniza no sentido mais amplo, porque ajuda a enxergar os outros homens, a enfrentar a própria condição humana.●"



Pensando no por quê de se estudar história juntamente com os inúmeros comentários e imagens sobre a legitimidade ou não das manifestações, penso que aquela antiga frase permanece verdadeira: nenhum Governo quer um povo instruído, porque pensar é um instrumento poderoso. Quem quer sofrer desequilíbrio na sua zona de conforto ganhando bem enquanto tem gente passando fome ou comendo o pão que o diabo amassou (juro que não sei o que é pior), passando frio, sendo dizimadas, etc etc etc. 










Hoje, caminhando pelas ruas do Rio de Janeiro me deparei com uma exposição de fotos de Ouro Preto. Se chama, acredito, "Ouro Preto não postal", com imagens de um cotidiano pacato, repleto de poesia. Mas tinha um escrito no papel que me chamou a atenção. Não sei se a citação está certa, nem a referência. Dizia o seguinte:

Quem não se movimenta não sente as correntes que o prendem. - Rosa de Luxemburgo


Realmente. E deve ser por isso que tem muita gente falando merda. Essa bagunça toda por causa de 20 centavos? Vândalos prejudicam o trânsito? Ai ai.





Outra leitura que fiz e achei muito boa, tão boa que nem dá pra ficar separando trechos, se não vai variar plágio, é da Clara Averbuck

"Será que ainda tem como ignorar essa insatisfação?

Segundo, me recuso a achar isso normal e acabar vivendo essa situação cotidianamente até acreditar que só ela existe. Se toda semana um policial me tocar uma bomba na cabeça e eu achar isso normal, vou acabar acreditando que o problema são os policiais, feito muitos policiais acreditam que o problema sou eu. Mas não. Eu e esse cara que me intimida e agride (até por ter apoio do Estado para isso) temos mai$$ em comum que ele consegue lembrar. E eu não quero esquecer isso, só por não concordar com as posições dele. (...)

Porque não é normal violência e abuso policial em uma manifestação legal. Porque se ninguém se responsabiliza por nossa idoneidade física, nós temos que fazer."

Sei que não estou escrevendo nada que vocês (caso exista um grupo de leitores) já não tenham lido por aí. Mas é que me afetou de um tanto, e me encheu de orgulho de ser brasileira. E aos que possam vir criticar falando sobre o atentado ao patrimônio público, vou me apropriar da frase de uma pessoa X que li no Facebook: "se essa multidão de pessoas tivessem cometendo vandalismo, aí sim seria trágico". É tipico da mídia dar informação distorcida e compactar/marginalizar uma série de ações. Uma postagem do Eu me chamo Antônio de hoje foi genial:



Enfim: me deu o maior orgulho de ver essa galera toda nas ruas. De arrepiar. Mesmo que eu tenha só visto por vídeos, imagens dizeres. Tá, eu sei que é feio. Talvez eu não esteja no grau evolutivo dessas pessoas, mas fico feliz com a atitude e com a diferença. Toda manifestação já é uma perspectiva de mudança.





Ps. imagens Rio De Janeiro/São Paulo retiradas em páginas aleatórias do Facebook.

domingo, 12 de maio de 2013

O Rio de Janeiro, fevereiro e março.

Minhas impressões sobre o Rio de Janeiro me fazem lembrar a todo momento da poesia "Ruas" do Drummond. Já que hoje estou escrevendo com a luz, o poeta é que dará palavras às imagens.



Por que ruas tão largas? Por que ruas tão retas?


Meu passo torto
foi regulado pelos becos tortos
de onde venho.



Não sei andar na vastidão simétrica
implacável.


Cidade grande é isso?


Cidades são passagens sinuosas
de esconde-esconde




em que as casas aparecem-desaparecem
quando bem entendem


e todo mundo acha normal.


Aqui tudo é exposto


evidente


cintilante. Aqui


obrigam-me a nascer de novo,
desarmado.

quarta-feira, 8 de maio de 2013

só a poesia salva?


me confisco entre os rastros
monstros da noite
caleidoscópica visão do ápice.
rasgo as palavras como rasgo panos
trapos
de indigestos
inflamados
antigos atos -
na ata da vida, somos todos
assinaturas tortuosas.

eu quero da luz
a visão de feixes

e recair
calada
deitada
na imensidão do seu colo escuro.

*


quando peço que venha
tanto quanto não peço
não vem.
não escuta meu pranto
não pensa na ânsia
não vê o excesso de lucidez.
re-leio os grandes
médios
pequenos
e o corpo não fala
não transmuta
não poesia.

*

Dentro de cada
qual seja o que ali
apita
Desavessa-te a face;
da carne pungente
se liquefaz.
Minha voz irrequieta
enquanto vinda de
cantos - Talvez pontes
Respira o vento
passadouro
dos verbos conjugados.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

mais um caso de poesia.


tanto importa
o movimento das águas
e a quebrada nas rochas.

o que o céu desfez

é apenas um grito escuro
que contradiz o enigma da esfinge.

*


te entardeço no eu-ser

meu ser obscurecido.
que entraves se esconde o riso,
a ânsia
e os por quês?

da ineficácia das palavras

da indefinida conjunção
nos contextos (in)variados

qualquer definição mataria a alma toda.


na redução do desapego 

insaciável verdade
não grata

dos nossos entremeados

dos medos
decifra-me

na cantiga inaudível

do meu cansaço.

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Da mediocridade dos escritos.

Em dia de leme torto, qualquer razão, qualquer conforto, era meu crânio triturado em meio ao barulho ordinário. Começou a escrever palavra a palavra como se vomitassem impropérios, embora sussurrados, em seus ouvidos. Resolveu aceitar e transcrever, ficando, assim, com os créditos da autoria. Era  um escritor medíocre, de uma cidade medíocre, pertencente a círculos de amizades medíocres em que se faziam grandes encontros medíocres semanalmente para discutirem a mediocridade de seus medíocres escritos - embora, em suas conversas, tratassem como obras raras em meio à modernidade corrompida. Acredito que talvez eles percebessem que os corrompidos também eram eles, seja na orgia, hipocrisia, tantas ias e idas e voltas. Mas, quem nunca cuspiu para cima, não é verdade?

Resolveu escutar a voz novamente. Sem escrúpulos os sem destinos que averiguam as águas desoladas da imensidão, te corrompem, te compram, te desmantelam em suas próprias vestes e vestígios; talvez te fosse mais sereno desistir do barco, e espiar os pardais e seus trajetos. Não conseguia captar sentidos, mesmo que des-co-nexos, em cada verbete. Nem ao menos o faziam remeter a algum escritor favorito. 

Em que destino decapitado esqueceu suas promessas? Talvez um tanto comum te pareça a imaginação não florida, deflorada de cânticos pagãos. Nem preparado ou atordoado, que se mantenha na ignorância das vozes, do sussurro, que contorcem vísceras e decrepitam sonhos.

Assustado, resolveu por pegar no sono, e andar por caminhos já percorridos.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Histórias felizes demandam tempo. Eu tenho pressa.

Escutou no rádio uma canção que não lhe era familiar. Tentou aos poucos decorar fragmentos, acordes, timbres, até assimilar como um todo; da poética à parte técnica. Não era bom instrumentista; entretanto, de uma percepção auditiva invejável. Reconhecia pessoas por vozes, como um cego na multidão, e as escutava a uma distância que os detentores de segredos sentiam-se acuados.

Cantarolando, seguiu seu caminho previsível pelas ruas que davam no trabalho. E sentindo - fragmentos, acordes, timbres - percebeu em que acinzentada paleta estava sua vida. Quem sabe um dia pudesse viver e sentir por ele mesmo, pensou.

Decepcionando com a sua desilusão, que antes não atrapalhava de tão adormecida, esqueceu-se do bueiro óbvio da Rua do Vidigal.

Caiu, morreu e não lhe sobraram, ao menos, desejos nem migalhas.

domingo, 27 de janeiro de 2013

Mostra de Cinema de Tiradentes - Viajar é para dentro.

Nos últimos três dias fui para a Mostra de Cinema de Tiradentes. Tem, pelo menos, uns cinco anos que digo em alto e bom tom "quero ir um dia". Era sempre um problema ou desculpa: falta de dinheiro, preguiça, permissão dos pais. Em setembro, eu e mais duas amigas combinamos de ir.
De começo pensei que seria só, me perdoem o termo, fogo no rabo. E até semana passada eu estava pensando em desmarcar. Acabou que no fim, a viagem de nove horas (Paraguaçu-Varginha-Lavras-São João del Rey-Tiradentes), valeu muito a pena. E fico muito feliz por, desta vez, não ter encontrado nem problemas, nem desculpas.
Para quem veio (tá, sei que esse blog não é lá muito popular) ler resenha sobre o festival talvez não saia da leitura feliz ou realizado. Resolvi contar dos dias com imagem e poesia. Porque viajar é sempre pra dentro.

Varginha, 24 de Janeiro de 2013

Em todo canto
na prece
no pranto
é minha voz que ecoa mundos
antes sonhados
E na luz mediada
Nas curvas, retas
estradas
Todo caminho é meio

*

No dia desse quase torto
de estrada em enxada
tracei meu destino.
Como o que já não se espera,
entrou na contramão do mapa.
Perdeu destino traçado;
ganhou a vida.


 Lavras, 24 de Janeiro de 2013

Quando ele se separou de si
aos dezessete anos dos seus dias
percebeu que adiante até ali
era mistério.
Condescendente que era
deixou as cartas, búzios
mesmo antes, difusos
às novas sortes de vento e chão.

Frágil. Como se o mundo bordado em suas mãos fossem como as linhas mais delicadas do reino. A cada vez que agulha passava, não lhe saía sangue, mas água perfumada de lavanda. Talvez fosse mistério da medicina, ou algum milagre de dia de Santos. Eu preferia acreditar que ela, enquanto anjo, disfarçava de menina.







São João del Rey, 25 de Janeiro de 2013

Nos entrelaços da sua mão
uma vida e mais outras
a eternidade te faz voltas,
cirandas em seu corpo que o universo abriga
em seu ritmo nunca fatigado.
Talvez te fosse aquela luz
que no meio do cansaço
segue nas retas
nas curvas
quebrando galhos,
ossos e o vento que atravessa a noite.
Te escrevendo,
como se fosse em trilhos,
as palavras se desdobram, intermináveis.


Tiradentes, 26 de Janeiro de 2013

No descampo desse céu
como que água invertida
venho de longe
de casa
da vida de intermináveis voltas.
Eu me esqueço do tempo
tragando a invisível ferida.








segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

já aviso: é um caso de poesia.

Nos intervalos
gretas
fendas de luz
é que me enxerga a vida.
Me cobre o medo
me rompe os caminhos com chuvas de flores

nem sempre o mal
o mar, irresoluto
em minha vida.

*

Com compasso
ritmado ao coração
na imensidão do seu trajeto -
algo de vida, semeado de luz
Te transborda
sem pedir ou dizer
que o tempo é agora
e se arrasta por calendários
jamais descritos.

*

Enquanto tudo é imensidão
nos desvarios, intempéries do mar
Te bendigo de dizeres coloridos
Na infinitude do tempo
No doce da fruta
Na delicadeza da pétala que,
ao seu tempo,
cai.

*

Lá no fundo de mim
sempre sertão
que na aridez da terra
infrutífera sorte desertou
cai um
p
i
n
g
o
e outros mais
que regam cá dentro
e a sorte boa refaz.

*

Refeita
Recomposta
de diversos sons, tons, cais
meu porto seguro
é o agora e adelante
E todo encanto
que mostra é Sua benção.
Se me perguntam sua face
logo digo:
Se parece com amor.

*

Em meu trajeto
dessa e de outras
quero a sorte e o aprendizado -
os bendizeres sobre mim e ti,
universo em uníssono.

sábado, 12 de janeiro de 2013

O eterno retorno.

Serviu vinho no copo americano mesmo. Embora o copo não demostrasse fineza, a bebida era de boa safra. A pequena sala com também uma pequena mesa, comprimia o ar com a tristeza dos tempos, dos descendentes daquela família sem linhagem que conseguiu alguma riqueza para me servir aquele vinho diante daquelas inúmeras fotografias pregadas na parede. Na verdade, não me importava. Nem de vinho eu gostava, e me importava menos ainda. Estar ali era como captar uma vida inteira. Então você veio fazer uma entrevista sobre o antigo jornal. Sim, disse eu, um trabalho para faculdade. Foi a primeira coisa que me veio à mente, talvez até por vontade de que assim o fosse. Eu que mal terminei o ensino médio. Pode começar a perguntar, mesmo eu não sabendo que importância essa maldição familiar poderia ser interessante. Desculpa, herança. Durante os seis segundos que duraram a sua fala, ele pensou nas lembranças acumuladas de 7 gerações inteiras. Não entendia de que forma se conectava aos seus e abrigava em si todo o peso do mundo. Foi o único que sobrou de uma família de 7 irmãos, 15 tios, 4 avós, 23 primos, pai, mãe e 3 agregados - tirando os irmãos e primos e tios espalhados pelas proximidades daquela cidade erma, concebidos sobre o estigma dos amores súbitos. Não sabia como tinha calculado toda essa pequena comunidade em fração de segundo. O jornal foi fundado em mil novecent...Sou sua filha. Sem ânimo mas com alguma surpresa no canto dos olhos, ele disse em voz alta: o eterno retorno sem fim, e fitou o assoalho da pequena sala onde a respiração parecia quase não existir, só se sabia ali pois os dois corpos sentados em cadeiras velhas, porém em bom estado, permaneciam vivos. Tomando em um gole só aquele vinho, como se no copo tivesse aguardente, me levantei em um pulo para seguir meu caminho como sempre havia feito antes daquele momento mal calculado. Ao ver que eu não falaria mais nenhuma palavra e perceber que nem ao menos sabia meu sobrenome para uma futura pesquisa no catálogo telefônico, talvez, segurou minha mão sobre a mesa: aceita um café?

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Não existe amor em SP

Já fui criticada por acreditar em contos de fadas - com essa idade?! -, por achar pessoas feias bonitas, e pessoas chatas legais. Aliás, aconselharam que eu escrevesse um livro, dando dicas de como atingir esse nível de abstração e ver coisa boa bonita feliz onde não tem. Na época de pensamentos vestibulandos e a vontade de ser jornalista veio a idéia inovadora: montar um programa televisivo onde todas as notificações fossem boas, já que se torcesse o Jornal Nacional saía sangue. No final das contas, virei historiadora. Talvez minha vida renda mais frutos nessa profissão do que no outro ramo - diante de tanta tragédia, manipulação, aceitação, corrupção quem quer ver notícias boas corre o risco de ser rotulado de alienado. Prazer, alienada.

Liniers, um quadrinista argentino, possui dois personagens pelos quais eu sou apaixonada: Enriqueta e Fellini. Tá pra existir mais delicadeza. Tem uma tirinha em especial que me faz lembrar sobre essa questão das notícias boas (que não deveriam ser julgadas como de menor importância em relação às econômicas ou às catastróficas). 


Esses dias descobri dois sites bem interessantes. E hoje me peguei desesperada olhando o histórico do computador porque eu não conseguia lembrar o nome deles. Para não ocorrer mais esse desespero e poder compartilhar com outras pessoas que talvez pensem ou sintam de forma parecida com a minha é que estou escrevendo esse post.

O primeiro site é um tumblr (me perdoem a ignorância, mas eu não sei qual a diferença disso pra um blog) que se chama A boa notícia do dia. A idéia surgiu diante das retrospectivas de final de ano que exploram detalhadamente as tragédias no decorrer dos 365 dias. Querendo desdizer a máxima de que o povo gosta é de ver desgraça, duas moças resolveram "colecionar novidades que fazem sorrir", buscando ao menos uma notícia boa por dia. E foi nesse tumblr que descobri o outro site (que infelizmente está em manutenção, mas a idéia é bem legal). Ele se chama Dreabe, e é uma rede social que ajuda as pessoas a realizarem sonhos. Quem sabe um dia eles me ajudam a realizar o meu (que de tantos não cabe no plural):


quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

de cor e mente


Lá venho eu com imagens de novo. Não entendo como ele anda em uma corda bamba ou segue passo a passo em linha reta - dessa forma, imagino que ele não tenha labirintite. Como se não bastasse linhas, marcas, caminhos, carrega - pelo menos até essa parte do trajeto - coração e mente equilibrados. 

Tudo é uma questão de manter a mente quieta, a espinha ereta e o coração tranquilo.


Acredito que esse seja um dos maiores desafios da vida. Ou pelo menos da minha. Há alguns meses coloquei como meta, mesmo sem perceber, alinhar esses indicadores - de cor e mente - do que eu chamaria "uma vida feliz". Tenho até medo de falar sobre esses assuntos e desequilibrar  todo um sistema destinado à minha sobrevivência na selva ou na aridez das relações humanas. Supersticiosa que sou, não falo.

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

marrapaiz, o mundo é bem mais.


Olhando uma página no facebook me deparei com essa imagem. Ao procurar de onde vinha, acabei descobrindo uma banda que se chama Los Porongas, o som é bem gostosinho e me lembra alguma outra banda que eu não sei dizer qual. 

A temática do viajar tem estado frequentemente presente em mim. No sentido de vontade prática ao invés daquele eterno sonhar. E pude perceber que, de fato, viajar é a única coisa que você compra e te deixa mais rico. Não que os livros também não se enquadrem. Mas, ao meu ver, não existe nada mais fascinante que conhecer pessoas e paisagens e culturas e cheiros e sensações diferentes.

Erudição à parte, mas viver a vida é fundamental.

Ojalá que eu possa andar o mapa mundi em espiraladas!

Talvez o próximo passo seja juntar dinheiro ou aprender uma outra língua ou traçar roteiros ou andar por pequenos espaços não menos interessantes. Uma vez vi um blog onde duas meninas postavam a cada dia do ano coisas que nunca tinham feito (365 nuncas). O que é um grande desafio uma vez que estamos cada vez mais presos a rotinas, no andar mecânico que muitas vezes fiz ao ir à faculdade. De repente me assustava porque que nem havia percebido que estava andando pela rua do Filosobar, e eu queria tanto ir à Padaria Vitória, droga. Quando conheci o blog achei a idéia genial. Até hoje estou amadurecendo, com preguiça, a idéia de fazer algo parecido. Será que conhecer um lugar diferente por dia seria um projeto muito ousado?

Embora o meu quintal seja grande e repleto de possibilidades a serem descobertas, mundo mundo vasto mundo, assim como você, vasto é meu coração.