Engole a saliva. Respira. Rabisca algumas palavras desconexas no papel. Começa uma oração pedindo à Deus que o ajude a aceitar. Interrompe. Não sabe se está pronto para tal realização de prece. Desmitifica o passado. Passa à limpo. Pensa nas tolices que cometeu ao acreditar. Perde o foco. Pensa na felicidade das pequenas coisas, o abraço no momento preciso. As palavras de afeto. Afeição. Ainda têm. Engole a saliva novamente. Relembra as várias fantasias folhetinescas de cinco minutos atrás. As boas e as más. Desordena-se na lógica do seu coração. Os manuais, tão práticos, não resolveriam aquele caso. As horas de terapia, tão pouco. Afinal, tinha vergonha de expor seus desajustes emocionais acompanhados de soluços esparsos diante daquela figura independente, de frente ao divã.
Como uma entidade sádica, nem ao menos levou a escova de dentes. Ou o anel. Todo relicário era dele. Como se deixasse as lembranças afim de evitar futuras assombrações. Brilho eterno de uma mente sem lembranças, lembrou no momento. Talvez volte. Melhor pensar que não.
Não rompeu o silêncio. Como uma caixa que não se deve abrir, assim permaneceu. A passagem das horas jamais fizera efeito reverso naquele coração impassível e fechado. O dele. Que com seu sentimentalismo da lírica e dos olhos, escondia muros, figuras submersas. Talvez eu não seja tão aberto assim, falou em voz alta.
Os amigos, na tentativa de ajudar, pouco entendiam. Talvez algumas racionalizações de sentimentos. Mas, de fato, qualquer apoio já era o mundo inteiro. Na contradição do que se sente, a dúvida latente.
Nas entrelinhas do que supõe saber, prefere esquecer em um canto, debaixo do tapete - como aquela semana em que receberia visitas. Por bem ou mal, jamais falaria a respeito. Com despeito, encerraria a noite sozinho. Mais uma das que viriam, inevitavelmente. Sem jeito ou vontade, guardou a escova e o anel em uma caixa verde no armário. Por tempo indeterminado.
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